infertilidades e confidências

E se eu tivesse desistido?



Tuesday, December 26, 2006

E se eu tivesse desistido?

Ana Oliveira

Tudo começou há 10 anos atrás. Como qualquer casal que se ama, ao cruzar na rua com crianças, imaginávamos o filho a que daríamos origem: a fisionomia, o carácter, os gostos e as tendências que eles mantêm com tanto afinco! Seria a sequência natural de uma relação madura e estável!

Devia ser fácil ter um filho.

Éramos saudáveis, os meus períodos certinhos, tinha conhecimento do funcionamento do corpo e da reprodução. Mas passou um ano e nada; dois anos e ainda nada. A ansiedade aumentava a cada segunda parte do ciclo, sempre à espera. Será desta? Mas nada acontecia!

Decidimos pedir ajuda. Marcada a 1ª consulta na Maternidade Alfredo da Costa (MAC), passámos ansiosamente 8 meses em lista de espera. Testes e mais testes, análises ao sangue, exames complexos como uma laparoscopia, mas sempre sem conclusão à vista.

A letras gordas e a vermelho ficou escrito no processo: «casal infértil por causa desconhecida». Só nos restava esperar por uma oportunidade através de FIV.

Aproveitámos o tempo de espera (2 anos!) para tentarmos entretanto através de inseminações; poderíamos conseguir, afinal nem se conhecia razão para tal dificuldade! Mas após 3 tentativas, nada conseguimos. Foi na FIV que se detectou finalmente o problema. Após retirarem 16 ovócitos em condições, nenhum deles fecundou. Nem um! Apesar de não se entender o motivo, o facto de terem detectado este problema aliviou-me, pois assim alguma coisa poderia ser feita, pelo menos havia um caminho a seguir imediatamente: a ICSI. Mas a idade já pesava, os meus 37 anos limitavam as hipóteses de sucesso e, além do mais, estava a atingir o limite no público.

Foi uma decisão complicada de tomar; nessa altura não tinha ninguém para me aconselhar uma clínica privada e foi às cegas que nos decidimos por uma, e, Lisboa. Por ter feito todos os exames na MAC, nem foi preciso repeti-los. Iniciei logo o processo de ICSI com o médico que me acompanha há 5 anos e por quem eu tenho uma admiração enorme, principalmente devido a uma grande sensibilidade para lidar com casais em desespero.

Afinal a nossa sensibilidade está à flor da pele e é nestes momentos que precisamos de apoio e carinho.

A 1ª ICSI deu negativa. Foi um balde de água fria, pois as expectativas eram altas. Supúnhamos resolver logo o nosso problema, mas a idade pesava na redução das taxas de sucesso.

Não perdemos a esperança. tentámos mais uma vez tentámos e engravidei! Nem queria acreditar. Foi uma sensação de felicidade extrema. Infelizmente o azar bateu à nossa porta: na 1º ecografia, às 7 semanas, verificou-se uma anomalia no desenvolvimento do embrião. Parou de crescer e o aborto aconteceu. Estávamos no início do ano; o Natal e Fim de Ano foram tristes e angustiantes. Mas o desejo de ter um filho era mais forte e a coragem e persistência venceram. A família, os amigos e colegas de trabalho apoiaram no que puderam e eu agradece-lhes por isso: o facto de falar sobre o assunto sem preconceito ajudou-me a tolerar melhor o silêncio que se criou dentro de mim.

Mais uma tentativa estava nos planos e engravidei novamente.

Com receio, desta vez mantive-me reservada. Só a eco das 7 semanas me garantiu que era agora: tinha ultrapassado esta fase com sucesso.

A gravidez prosseguiu como qualquer uma, os exames sucediam-se e as ecografias indicavam que tudo estava bem.

O entusiamo com a gravidez invadiu-me e o impulso para fazer algumas comprinhas nem foi reprimido pelo medo: tinha finalmente conseguido! Às 15 semanas foi feito mais um exame, a amniocentese, no meu caso de rotina, pela idade. Correu bem, apesar da grande ansiedade causada por este exame, pelo tempo de espera, pelo resultado etc.

A nossa cabecinha não lida bem com estas esperas. O telefonema tardava, mas nada me fazia prever o pior. Quando fomos à consulta marcada para essa altura, o meu médico comunicou-nos o resultado: tinha sido detectada uma doença grave na nossa bébé (era uma menina), incompatível com a vida! A interrupção era inevitável e mais uma vez o nosso sonho ruiu num instante.
A recuperação psicológica foi lenta; desta vez o embate foi muito forte, embora o desejo continuasse no nosso coração. Pensámos que pior não nos poderia acontecer. Talvez voltássemos a tentar. Diz-se que à terceira é de vez! E a 3ª tentativa deu também positivo, mas foi por pouco tempo: tratou-se de gravidez anembrionária e nem chegou às 7 semanas! A idade avançava, os 40 bateram à porta e a probabilidade ia reduzindo de dia para dia. Tinhamos consciência de que o nosso limite tinha sido atingido e começámos a pensar nas alternativas. A luz ao fundo do túnel existia, mas era outro processo muito complicado, demorado e para o qual ainda não estávamos ainda preparados: a adopção.

Como o desejo persistia e continuava lá escondido, à espera do momento, dissemos «Só mais uma vez! Agora ou nunca!». Este último tratamento foi ponderado, as ansiedades foram controladas e tudo correu com uma paz como nunca tinha vivido. Estava tranquila comigo própria, fizemos o que pudemos e lá fomos mais uma vez em busca do sonho. E bingo! Nova gravidez. Cada eco tornou-se um tormento. O obstáculo da amniocentese foi ultrapassado e uma menina vinha a caminho, cheia de vitalidade. A possibilidade de más noticias estava constatemente na nossa mente, mas tínhamos crescido com as experiências anteriores e a tranquilidade imperava. Tudo correu bem.

À data deste testemunho, 26 de Novembro de 2006, faz um ano que se deu o maior acontecimento das nossas vidas: o encontro “milagroso” entre a ciência e a vida.

O impossível foi ultrapassado e nesse dia preciso, após um mês de injecções diárias, a minha Vitória foi gerada. Nove meses passados, nasceu no dia 1 de Agosto de 2006, após um parto cheio de emoção.

O nome faz jus à sua história. Uma história que um dia terei muito prazer em lhe contar. Tem hoje 4 meses e é uma menina linda de morrer. Gosto de brincar com isso: afinal foram 10 anos de projectos e tentativas! A sorte bateu-nos à porta e a felicidade é infinita. Costumo dizer que devemos insistir nos nossos sonhos, para que mais tarde não nos arrependamos de não ter tentado.

E se eu tivesse desistido?



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